
Nos últimos meses enquanto a maioria da comunidade Bitcoin discute suportes, resistências e possíveis fundos de mercado, uma tensão muito mais profunda vem se formando nos bastidores — envolvendo desenvolvedores de alto impacto, figuras históricas e decisões que podem definir o futuro ético, técnico e político da maior criptomoeda do mundo. Entre os nomes citados estão Nick Szabo, referência intelectual do Bitcoin, e o brasileiro JP Maia, que se tornou um dos protagonistas da discussão. E embora quase ninguém fale disso publicamente, esse conflito ideológico tem gerado insatisfação, medo de mudanças estruturais e até pânico de mercado quanto a um fork na rede.
O centro da polêmica é aparentemente "simples:quem paga a taxa pode registrar qualquer coisa na blockchain?"
Ordinals, inscriptions e dados arbitrários gravados diretamente nos blocos reacenderam um debate antigo: o Bitcoin deve ser apenas um sistema monetário global e seguro, ou pode ser usado como um repositório imutável para qualquer tipo de informação? Para um grupo de desenvolvedores, essa liberdade total representa o ápice do ethos libertário: sem censura, sem controle, sem filtros. Se alguém paga, tem direito de gravar o que quiser.
Mas essa visão traz consequências profundas.Do ponto de vista técnico, permitir dados arbitrários torna a blockchain maior, mais cara de operar e pode comprometer sua funcionalidade principal — a transferência de valor segura e descentralizada. "Nós" completos ficam mais pesados, a rede fica congestionada, transações comuns ficam mais caras. Em momentos de estresse, investidores temem margin calls, liquidações e redução de liquidez, alimentando quedas de preço.
Contudo, o impacto ético e jurídico é ainda mais explosivo. Se a blockchain é imutável, o que acontece quando alguém grava nela conteúdo ilegal, imoral ou ofensivo? Alguns defensores da liberdade total afirmam: “isso é o preço da liberdade”. Porém, essa lógica ignora um ponto fundamental: "a ausência total de regras não necessariamente gera liberdade total e pura!" Na ausência total de regras, não há necessariamente liberdade total, pois, quem detiver mais poder controlará o ambiente e passa a ditar as regras — apenas o entrega a quem pode abusar dele.
Na ausência total de regras nem o "princípio da não lesão" está a salvo. O princípio libertário da não agressão (NAP), base do anarco-capitalismo, afirma que liberdade só é válida até o ponto em que não causa lesão a terceiros. No momento em que se defende que qualquer coisa pode ser registrada se houver pagamento, abandona-se esse princípio. Afinal, se alguém pode registrar conteúdo infantil, dados pessoais, difamações, ataques morais ou criminosos, mensagens terroristas, sem qualquer consequência, onde está o limite ético da não lesão a terceiros?
E aqui surge a reflexão incômoda: Muitos que defendem a liberdade absoluta nesses registros imutaveis mudariam radicalmente de opinião se, por exemplo, um ex–namorado ressentido registrasse de forma imutável na blockchain uma foto íntima de sua esposa, uma montagem ilegal com sua filha, ou um conteúdo envolvendo um menor da sua família. E aí? Continuaria defendendo que o “quem paga, faz o que quer”? Aceitaria que esse registro, agora público e eterno, não pudesse ser removido jamais?
Se não há regras, também não há mecanismos para punir, coibir ou impedir a lesão. A liberdade sem responsabilidade destrói o próprio fundamento libertário.
É isso que está causando desconforto entre devs, incluindo figuras respeitadas como Szabo e JP Maia. Não se trata apenas de uma disputa técnica — mas de uma luta filosófica pelo futuro do Bitcoin: será ele um sistema monetário global confiável e aceito pelo mundo, ou um repositório anárquico que pode carregar o pior da humanidade para sempre?
Enquanto o mercado finge que essa discussão não existe, a incerteza aumenta, mineradores e desenvolvedores se dividem, e investidores temem um possível fork ou mudanças de consenso — fatores que alimentam o sell-off e a volatilidade atual. Muitos Devs, inclusive, tem vendido parte dos ativos na moeda como demonstração de protesto.
No fim, muitos dirão: “Eu sou a favor da liberdade total. Quem paga deve ter o direito.”
Mas antes de repetir essa frase, vale a provocação final: Se você realmente acredita nisso, estaria disposto a aceitar que alguém registrasse para sempre na blockchain — pública e imutável — algo que lesionasse você ou sua família? Uma imagem íntima da sua filha, um ataque moral à sua esposa, um conteúdo envolvendo menores ligados a você? Se a resposta é não, então talvez a liberdade absoluta não seja tão simples, nem tão justa, quanto parece. Afinal, esse tipo de liberdade respeita o "Princípio Libertário da Não Lesão a Terceiros"?
As altas surpreendentes e inesperadas de #Zcash, #Monero, e #Dash também tem um toque dessa discussão, afinal, elas se propõe a manter sua natureza exclusiva de dinheiro e reserva de valor, fazendo com que boa parte dos maximalistas puros alinhados a Nick Zabo e JP Maia os vejam com bons olhos.
E é exatamente essa contradição que está incendiando os bastidores do Bitcoin — e que pode ajudar a impactar este momento.
Mas e você, o que pensa sobre isso?


